sexta-feira, 20 de fevereiro de 2015

Les temps sont durs pour les rêveurs ...

[...]
- Sabe a garota do copo de água?
- Sei.
- Parece distante, talvez seja porque está pensando em alguém.
- Em alguém do quadro?
- Não, um garoto com quem cruzou em algum lugar, e sentiu que eram parecidos.
- Em outros termos, prefere imaginar uma relação com alguém ausente que criar laços com os que estão presentes.
- Ao contrário, talvez tente arrumar a bagunça da vida dos outros.
- E ela? E a bagunça na vida dela? Quem vai pôr ordem?"
[...]

Amélie Poulain

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Aprendizagem sobre a vida - Experiências no Intercâmbio Nacional da IFMSA Brazil



Belém é uma cidade encantadora. Capital do Pará, região norte do Brasil, tem quase 400 anos de história. Belém vivenciou e teve importância fundamental em momentos ímpares na história do Brasil, como o período da borracha, no início do século XX, quando o município recebeu inúmeras famílias europeias, que influenciaram grandemente a arquitetura das edificações locais. Hoje, apesar de ser cosmopolita e moderna em vários aspectos, Belém não perdeu o ar tradicional das fachadas dos casarões, das igrejas e capelas do período colonial.

Decidi realizar o intercâmbio nacional em Belém por “n” motivos. Primeiro porque já havia conhecido e feito amizade com muitos paraenses nas muitas Assembleias Gerais (AG’s) da IFMSA Brazil que fui. Segundo porque me encantou a oportunidade de participar do estágio que estavam oferecendo (Estágio Clínico em Genética Médica). A descrição do estágio foi fundamental para garantir a certeza de que este era o estágio que sempre imaginei um dia participar, já que havia a oportunidade única de conhecer e trabalhar esse período do estágio com comunidades indígenas e/ou quilombolas. 

Parti de Natal no dia 8 de Janeiro, fui de avião até Belém. Assim que cheguei no aeroporto em Belém fui recebida pelo LONE da UFPA (Fredison), o Lucas (Coordenador Local do comitê da UFPA que me recebeu na casa dele) e o Luiz, coordenador da UEPA. Todos amigos queridos que já havia conhecido antes e me receberam com muita alegria e saudade! Inclusive com direito a cartaz e tudo! 

Minha estadia em Belém foi muito boa e tranquila. Ficar em casa de família é muito interessante, pois inclusive dentro de casa podemos conhecer a cultura local e ser ajudado quanto a como se locomover na cidade, lugares legais para conhecer, etc. 

Conheci muitos lugares em Belém, mas alguns pontos me chamaram bastante atenção e um futuro intercambista não pode deixar de visitar: o centro histórico (Complexo Feliz Lusitânia), parques e museus, como o Museu Paraense Emílio Goeldi, o parque Mangal das Garças, o mercado do Ver-o-Peso, a Basílica, Estação das Docas, o Bosque Rodrigues Alves, etc. Destaque importante para o Mangal das Garças, um lugar encantador, me apaixonei!!

Esses lugares citados acima são todos de visitação grátis (ou é necessário pagar um preço simbólico - 3 reais no máximo, com carteira de estudante). Saídas à noite também possuem um ótimo custo-benefício. Inclusive, alguns bares (destaque para o Mormaço e Palafita) chegando antes de certo horário não era preciso pagar a entrada e a diversão estava garantida para o resto da noite! 

Para locomoção dentro da cidade utilizava principalmente ônibus, cujo preço estava de 2,75 a passagem. Achei táxi um pouco caro, principalmente porque eles começam a colocar bandeira 2 muito cedo, cerca de 20h. Aqui em Natal, onde moro, é só depois das 22h. 

Sobre o Estágio: Dia 12 tivemos uma reunião com nosso tutor, Dr. João Guerreiro, o qual conversou conosco sobre nossas atividades, os quais não ficaram tão nítidas. A única certeza que tínhamos era que íamos viajar para as comunidades indígenas durante o estágio, mas não soubemos quando e nem o que faríamos antes de viajar. Posteriormente, soubemos que iríamos acompanhar Dr. Heredero no ambulatório de genética, no hospital universitário Bettina Ferro, terças e quintas à tarde. Os outros dias da semana ou não tínhamos atividades ou íamos para reunião e conhecer os laboratórios do departamento de genética humana e médica. Estar presente acompanhando atendimentos no ambulatório de genética médica foi incrível, já que em minha universidade (UFRN) não temos essa oportunidade, simplesmente por não existir. Logo, foi incrível a experiência de aprender mais sobre algumas doenças genéticas, ver de perto sinais e aspectos morfológicos antes só visto por mim em livros e no youtube. A maioria dos pacientes não tinha diagnóstico fechado, logo havia discussões muito ricas sobre algumas síndromes, algo que valorizou e intensificou nosso conhecimento acerca da genética médica. 

Na última semana de estágio viajamos para a comunidade indígena da etnia Xikrin. Fomos até Marabá de avião e de lá fomos de carro até a primeira aldeia (Kateté). Junto conosco foi uma equipe multiprofissional: médicos, técnicos de laboratório, dentistas, psicólogos, enfermeiros, nutricionista e arquiteta. Levamos também um cozinheiro que organizava nossas refeições do dia nas aldeias. Chegamos em Kateté na noite do dia 23 e dia 24 já iniciamos nossas atividades. 

Nos organizamos na escola da comunidade, já que o posto de saúde é muito pequeno... Ficamos organizados de forma que inicialmente, às 6h, iniciaria a coleta de sangue dos índios, depois disso, eles iriam se pesar e medir (altura, abdome e quadril), com isso eles recebiam a ficha de atendimento médico. Então era quando se organizavam para serem atendidos. Assim, acompanhei Dra. Regina no atendimento às crianças. Inicialmente foi complicado pela questão de comunicação, já que nessa etnia as mulheres não podem e não sabem muito o português, logo precisámos de um tradutor para que pudéssemos entender, pelo menos um pouco, o que as mães tentavam falar sobre o que seus filhos sentiam.  Aprendendo algumas palavras da língua deles, a comunicação se tornava cada vez mais eficiente. Mas infelizmente ainda era um obstáculo para colher informações precisas na história clínica. Obstáculos de comunicação que encontramos não só nessa realidade. Como profissionais da saúde precisamos sempre nos esforçar para um melhor atendimento à todos.. Conhecer a cultura e se importar em aprender um pouco mais sobre essa população tornou o estágio muito mais produtivo e especial. 

Em Kateté atendemos cerca de 84 pacientes (no segundo dia além de crianças também tivemos que atender mulheres, pois a demanda estava muito grande). Nenhum caso muito grave, a maioria escabiose, bronquite e gastrite, além de algumas crianças desnutridas. 

Dia 26 pela manhã foi a entrega de resultados e atendimentos de alguns casos que estavam com exames alterados e para fazer prescrições. À tardinha nos mudamos para a aldeia Dijudjê-kô, que fica a 16km de Kateté. O local de alojamento lá era bem melhor (possuía mais estrutura/casas novas/cobertura) mas tivemos dificuldade para alojar todo mundo. Mas, no fim, deu tudo certo. A escola também tinha uma estrutura muito boa, com salas bem equipadas e em ótimo estado. Antes de jantar paramos numa sala de aula para nos apresentarmos aos alunos e estes se apresentarem para nós. Cada um falou de seus sonhos e o porquê procuram estudar cada vez mais, todos, sem exceção estudam com a finalidade de ajudar o próprio povo, de forma que no futuro possam voltar para que não dependam mais de ações como as nossa. Os atendimentos nessa aldeia se seguiram como em Kateté, e no último dia viajamos para Õojã, a terceira e última aldeia. Lá só atendemos e fizemos os testes laboratoriais de manhã, já que é uma aldeia com menos de 70 indígenas. Após o almoço partimos de volta para Belém, dessa vez uma viagem de mais de 15 horas de carro. 

Enfim, esse intercâmbio foi sensacional. Tanto por parte do comitê UFPA e suas diversas atividades que tentaram integrar os intercambistas em suas campanhas e eventos, tanto por parte dos amigos que reencontrei e aqueles que conheci,  como também pela maravilhosa cidade que é Belém do Pará. A fatídica semana nas comunidades indígenas ficará gravada para sempre em meu coração e minha memória. Não aprendi apenas sobre a medicina, aprendi muito mais sobre a vida. 

Mirella Cristina Silveira Gomes
Acadêmica de Medicina - 6º Período - Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
Former National Officer on Human Rights and Peace (NORP) 2013 - 2014
Local Officer on National Exchange (LONE)
International Federation of Medical Students' Associations of Brazil | IFMSA Brazil